Fins de 1974, no
extremo sul de Angola, a nossa comissão arrastava-se penosamente quando fui
testemunha de uma cena, algo insólita.
Estava eu em
companhia de um colega que devendo ser transferido, solicitou a secretaria, a
fim de que lhe fornecessem algumas esferográficas ao que a dita acedeu,
evidentemente e quando o “estafeta” lhe trouxe o referido material, exclama o
meu prezado camarada:
Podem muito bem
dar-me isso tudo,( r.) muito para eles.
Fiquei atónito, mas
mantive o silencio, visto o fascismo militar, ser pior que o outro. Se mantive
o silencio, não esqueci e como fui a única testemunha da cena, seria pena levar
o segredo comigo para a sepultura.
Para que não haja
ambiguidades convém esclarecer que por “eles” se entendia o pessoal da
secretaria, mas o pronome pessoal devia ser posto no singular e certamente em
maiúsculas: “ELE”, porque se fomos lesados, só ELE podia beneficiar do que quer que fosse, todavia falemos no
condicional por prudência.
Fazendo uma
retrospectiva, vejamos: Em
Ambrizete, ou seja onde iniciamos
a comissão, havia uma riqueza incomensurável na imensidão Oceânica, mas
não possuíamos frota pesqueira através da qual pudessem ser desviados uns
tantos carapaus ou sardinhas. Nas cercanias de Nambuangongo
havia muito café, mas não
éramos proprietários de nenhuma
fazenda ou roça que proporcionasse o desvio de uns grãozinhos. Em pereira d’Eça nem mandioca havia,
consequentemente não consigo desvendar como alguém poderia lesar-nos.
Mas ... Se o nosso
Estimado camarada declarou ter (r) para alguém sem que ninguém o interrogasse
ou torturasse, algo de misterioso
subsiste.
Pode parecer
mesquinho, recordar estes factos quatro décadas depois, mas é sobretudo confrangedor
constatar que como se a guerra não bastasse, haver alguém capaz de manipular um
colega nosso, a fim de que este nos lesasse. Com (r) ou sem eles algo
aconteceu. Convém que se saiba que a guerra não era só entre brancos e negros,
havia outra guerra que emanava do ar condicionado e nos condenava a certa
miséria.
Se os críticos o
desejarem, posso publicar aquela estoria que começa assim: Você agora, não é
vagomestre, você agora é sapador.
A.L.
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