Artigo 19° da Declaração Universal dos Direitos do Homem
Em tempos que já lá vão, também eu era um rapazito de 9 ou 10 anos, e como tal, também eu frequentava a escola. Certo dia a professora mandou-nos fazer uma redacção, e sem saber porque, entendi eu que devia fazer alusão à guerra do Ultramar.
Os soldados portugueses, dizia eu, deviam seguir o exemplo de Nuno Alvares Pereira, ainda este ano as suas relíquias passaram pelas estradas do pais; as ruas estavam enfeitadas, e nos deitávamos flores.
E certo que naquele ano, o governo decidiu como que “ressuscitar” as relíquias do herói de Aljubarrota e nos, lá estávamos todos orgulhosos com a nossa bandeira erguida, devendo aspergir determinado veiculo com pétalas de flores. Nos cantamos Nuno de Santa Maria salvai Portugal, nos cantamos os Heróis do mar.
Fiquei todavia decepcionado com a minha bandeira. Ai se a historia se repetisse, eu encontraria papeizinhos verdes e vermelhos, amarelos e azuis, faria uma bandeira com esfera armilar, um escudo e as quinas, sem esquecer os sete castelos conquistados aos mouros, em suma, uma bandeira digna dos nossos avos.
A historia não se repetiu, mas o destino apanhar-me-ia dez anos mais tarde no Regimento de Infantaria 14. Olá, figurão, és tu o tal?! Parecia dizer-me o destino. Vem cá, terás umas lavaduras ao meio-dia, dar-te-emos um copito de tinto para compensar. Convém recordar que em Angola, nem tinto havia. Na guerra o capitão dizia: o comer esta bom; se algum disser o contrario, traz-me o numero dele, que eu dou-lhe dez dias de detenção.
Esquerdo, direito, esquerdo, direito, esquerdo, esquerdo.... Havia um mês que reaprendíamos a caminhar, quando fomos informados que íamos receber o primeiro salário. Formados em bicha de pirilau, via-se lá ao fundo um homem sentado a uma mesa, sobre a qual se encontrava uma caixa de metal. Pensava eu, pobrezito que nos dariam com que pudéssemos pagar meia-duzia de cervejas ; era tão grande a miséria naquele quartel, (e nos outros também). Querias?! Querias cerveja?! Toma lá cinco escuditos e cala-te. Podiam dizer-nos que não havia “massa”; talvez nos pudéssemos fazer aquilo grátis; lá estava o nosso patriotismo todo.
Mas aquela moeda revestia-se de um significado muito especial: talvez um teste; talvez nos fossemos considerados apenas um pó. Um pó que permitia que a guerra continuasse e eles ganhassem fortunas enquanto nos chupávamos pelo dedo. A partir de então, nos seriamos considerados seres sem cérebro nem coluna vertebral, destinados a ser vergados e torcidos enquanto eles quisessem.
No tempo de certo Csar havia na Rússia um ditado que dizia: A alma pertence a Deus, a cabeça ao Csar, e as costas ao patrão.
Nos pertencíamos corpo e alma ao exercito, formatados para o tiro ao preto.
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