É FILHO DE BOA GENTE!A l'attention de mes lecteurs :

GUERRA COLONIAL EM ANGOLA. DO ZAIRE AU CUNENE, PASSANDO PELOS DEMBOS.
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OBRIGADO PELA SUA VISITA.

QUEM NAO SE SENTE, NAO É FILHO DE BOA GENTE!


Se servistes a Patria que vos foi ingrata, vos fizestes o que devieis, e ela o que costuma.
Padre Antonio Vieira.

A nação é de todos. a nação tem de ser igual para todos. Se nao é igual para todos, é que os dirigentes que se chamam Estado, se tornaram quadrilha.
Aquilino Ribeiro. In quando os lobos uivam.

"patria", confiscaste-me os meus melhores três anos. Diz-me agora o que posso confiscar-te.

samedi 31 décembre 2011

O ANGOLA

Algures entre Nambuangongo e Beira-baixa, dei um dia comigo a contemplar um espectáculo que por mais pueril que parecesse, era finalmente magnifico.
Se o paraiso é possivel...
(foto net)
De longe, pareciam gafanhotos, mas à medida que a viatura se aproximava, a imagem clarificava-se: Ele eram dezenas e dezenas, ver centenas de avezinhas de todas as cores possiveis  e imaginaveis saltitando de uma erva para a outra na crista das quais, construiam os ninhos ou alimentavam os filhos.
E certo que estávamos em Angola, mas para que o capim culminasse a cerca de dois metros, devia a zona ser bastante humida, precipitação suficiente, terreno acidentado, logo floresta densa propicia a emboscadas. Era num cenário desses que os homens se matavam como feras, e deste modo, la se ficavam os "meus" ricos passarinhos sem um olhar, sem ninguém para dizer: que coisa maravilhosa.
... é em Angola.
Digam -me se m lugar no mundo onde seja possível semelhante proeza, se existe um recanto onde os passarinhos sejam capazes de tal arquitectura. 
Parecia recuar dez anos: recordava o tempo em que através da janela do meu sotao, observava os pintassilgos adultos introduzirem minúsculas  sementes verdes  nos biquinhos dos filhos que tinha previamente raptado, e metido numa gaiola. Soube mais tarde que eram sementes de urtigas.
Descansem pintassilgos de Portugal e dos Algarves: Um dia plantarei urtigas no meu quintal, a fim d que "todos" se possam servir.
Angola, "sobrevoei-a" entre Zaire e Cunene, mas que as guerras acabem, que nao mais vejamos o rico solo Angolano regado com sangue humano, e um dia poderemos dizer:
Se o paraíso existe, é em Angola! 

jeudi 29 décembre 2011

QUE SE PASSA ESTA NOITE À BEIRA DO CAIS

Em Nambuangongo  nao havia biblioteca! Em Nambuangongo nem p...  havia! No interior de uma velha cabana, havia todavia um monte de velhos livros empoados amarelecidos digestíveis apenas numa espécie de salada russa, isto é: ler um capitulo dum, depois de um outro e, deste modo, por entre romances de pacotilha, e as ficçoes insípidas de Julio Verne, ia " navegando" para longe do inferno verde que nos cercava.
No decurso de uma dessas "fugas" deparei com a odisseia de um grupo de jovens, que na sequência de momentos difíceis, estabeleceu um pacto, nos termos do qual, em caso de novas dificuldades, bastaria um sinal, uma espécie de senha, e todos acorreriam: "QUE  SE PASSA ESTA NOITE À BEIRA DO CAIS? " 
Era mais ou menos isto. Visto o desprezo a que fomos votados como ex-combatentes da-me vontade de gritar: Que se pasa esta noite à beira do cais, companheiros de Nambu., Madureira e Zala? Beira-Baixa e Quixico? Veteranos da Maria Fernando e do Tari? desterrados do Lue, degredados de Quipedro, que se passa na cabeça dos nossos "governantes"?
Por mais íntegros que sejam os que "governam, (também os ha,) gravitam à sua volta um punhado de chicos espertos, oportunistas prontos a lamber as botas, (como dizia Caetano), a tudo o que for politico em troca de tacho vitalicio para eles e os amigos; os amigos dos compadres e os compadres dos amigos. Se antigamente era a lata, hoje é o tacho, inox, blindado, à prova de bala.
Reserva-nos  esta "patria" madrasta que a muitos de nos so deu guerra e miséria, cento e nao sei quantos  euros em troca dos nossos melhores anos. Nos que deixamos um pouco das  nossas vidas nas matas Africanas, nos que vimos a morte de perto, teremos de dizer a essa gente que meta no "olho" a esmola que nos reserva para quando, ou se chegarmos à idade da reforma?


Antonio S. Leitão.

mardi 27 décembre 2011

E A BALA ESPREITA, EU SEI QUE CUSTA...

Algo de terrivelmente barulhento se aproximava du nosso aquartelamento. Por tudo o que era caminho, estacionavam contorcidos sob o peso da carga, grandes  Volvos e  Scanias, anunciando-nos que tinhamos batatas e macarrao para mais duas semanas.
Tendo partido de Luanda, destinava-se aquela coluna de camiões, também conhecida por M.V.L. a abastecer as tropas "estacionadas" nao so em Nambuangongo, mas também Madureira e Zala a Norte, Quixico, Lue e Quipedro, a Leste, ficando ja para tras, Beira-Baixa, Quicabo, Balacende, etc. etc.
Estando nos, numa especie de "no rodoviário", o nosso Pelotão escoltaria a componente que virava para Leste, enquanto os tais veículos ruidosos que finalmente eram pequenos blindados pertencentes aos Dragões com base no Caxito, ( Ola camaradas, um abraço quaisquer que sejam as vossas opiniões,) "rumariam" com outros para Norte.
Geralmente havia numa C.C.S. um grupo de Sapadores outro de Reconhecimento e Informação, que reunidos formavam o único Pelotão operacional, que por formação e experiência tinha por "vocação" sair quando necessário. Depois de "seleccionados" os trinta indispensáveis para o "passeio", ficavam sempre alguns, e quis o acaso que naquele dia eu ficasse por "casa".
Da frente da cabana que nos servia de caserna, observava eu o "ballet" daquela "cavalaria" toda, quando um colega que "morava" do outro lado da rua, me veio felicitar, dizendo: estas com sorte pa, hoje nao vais a Quipedro. Informei-o que podia ir no seu lugar; passamos pela secretaria, mandamos alterar os respectivos serviços e acto continuo preparo-me para a "excursão". Estava eu pronto para "arrancar", quando o meu prezado camarada me veio dizer que nao valia a pena; iria ele no seu devido lugar. Estava decidido, e fui eu.
Ja narrei nestas colunas que anteriormente tínhamos caído numa emboscada, durante a qual me ocupei de municiar uma metralhadora pesada tendo "abandonado" a minha G-3 no chão metálico da Berliet o que teve por efeito danificar o manobrador da minha arma; que nao "noticiei os danos em parte, porque o "pedestal" sobre o qual se encontrava o Com. de Comp. era tao elevado que tornava qualquer dialogo "missão impossível". Diziam  também os mais os mais antigos que a partir dai, nao faltariam emboscadas,  e eu traduzi: oportunidades para relatar o incidente e como nada impedia o normal funcionamento da arma, entao,... p. que p. a G-3 e mais o dono. A arma nao era minha,o que nao impedia de a acarinhar, limpar (nao a engraxava, porque nao era necessário; ela "dormia" dependurada ao fundo da cama, e se nao dormia entre os lençóis, era porque nao queria; convém recordar todavia que durante durante todo o tempo de   tropa nunca tive arma mais velha que em Angola.
Tinham eles medo que vendesse ou deixasse roubar um espingarda em bom estado?! talvez fosse por isso, e compreendo agora a razão pela qual um dia de "passeio" me meteram nas maos uma HK-21,(creio que era essa a"marca") e deste modo, se deixasse roubar uma, ficava com outra.  Chamavam-lhe metralhadora, mas equipada apenas com um carregador pouco a distinguia da tradicional G-3. 
Finalmente com a conversa, quase esquecia o M.VL. , Quipedro, o meu banco de pau, os solavancos, o po, que entrava na boca orelhas olhos e naris, que so um grande lenço conseguia proteger; quem pudesse adquiria uns óculos de " motard "e deste modo protegia-se melhor.
 A guerrilha continuou a nao nos incomodar e a minha G-3 continuou danificada.
POSSO SER EU, PODES SER TU, ENTRE QUIPEDRO E NAMBUANGONGO.


Antonio S. Leitao.









QUARENTA ANOS.

Quarenta anos mais tarde
Se te encontrasse por acaso
Numa rua da cidade de Viseu
Ficava parado, e olhava-te sorrindo (?)
Talvez te dissesse apenas: sou eu!

Nao te dava o meu numero de telefone
Nao te convidava para o almoço
Nao sei qual seria a minha reacção
Pelo tempo fora, continuaríamos "amigos"
E cantaria tanta vez esta canção: Estou farto deles!...

Quem passou pelo R.I.-14, mais precisamente pela terceira Companhia, nao esqueceu certamente o coberto sob o qual recebíamos os primeiros ensinamentos em matéria de instrução militar. Ai estávamos nos, certo dia de Maio de 1971, quando se aproximou do nosso Pelotão o Com. de outro grupo queixando-se ao nosso Alferes: " Eh pa, estou cheio de sede!"
Vendo o estado do seu colega, o nosso chefe dirigiu-se a mim nestes termos:" O jovem vai buscar agua para o nosso Aspirante".
Comecei por perguntar onde , depressa vi que nao era o lugar nem a hora para "parlamentar". corri na direcção da cantina, mas estando esta fechada e conhecendo ainda mal a topografia do quartel, voltei para o Pelotão dizendo ao Alferes que nao tinha encontrado agua.
"Paga"! - respondeu o homem.
Pagar significava atirar-se ao chão e fazer determinado numero de flexões.
Tentei argumentar, mas era tempo perdido.
"Paga dez, vinte."
"Mas o meu Alferes..."
"Paga 30, 40."
"Meu Alferes, mas..."
"Paga 50, 60."
Quando vi que a "factura" começava a ser pesada, cumpri a sentença, e levantando-me informei  o meu superior que tinha "pago".
Nao sei se ria, certo é que nao chorava, mas entendeu ele que sorria, e decretou:
"Paga mais 10."
" Nao posso mais",- dizia eu.
"Paga mais 20, 30.
Nao havia nada a fazer; "pagar" , como se dizia.
Por fim, teve a petulância de declarar: "olha que eu sou cinico, sabes".
O tipo era sadico, como tantos naquele tempo.

Antonio S. Leitao.

vendredi 23 décembre 2011

O SENTINELA.



"Nunca tive feitio, para cangas nem trelas!"
(H. S.)
Durante o serviço militar, chamava-se faxina a quem lavava a loiça, plantão a quem guardava a caserna e sentinela a quem guardava o quartel, em Africa tudo podia mudar. nao sei se devido ao clima, o faxina "virava" plantão, e de repente sentinela; nao custava nada; bastava que um oficial caprichoso assim o decidisse.
Tínhamos em Nambuangongo três, (ou eram quatro?)  sanitas, outros tantos chuveiros e torneiras a que o Capitão chamava balneareos, mas como nem sempre a agua corria foi ai instalado um bidão que de vez em quando uma pequena cisterna enchia de agua, e ao lado um balde.
Seguidamente foi determinado o papel do faxina que por razoes estranhas aqui passava a ser plantão: O plantão nao limpa! O plantão verifica se cada um deita um balde de agua.   resumindo a "filosofia do Com. de Comp. , o papel do "plantão" era o seguinte: Cada vez que um utente se instalasse, ( as retretes tinham, luxo supremo, cortinas de plastico), o" plantão" devia verificar se o colega acertava no buraco, mas como a anatomia dos homens impedia uma visão rectilínea do acto, ele devia interpela-lo e dizer: eh pa, poe a ferramenta de lado, para que eu possa ver se  acertas no buraco.
Compreendi enfim a razão pela qual na maioria dos casos as nossas retretes em Angola, nao tinham portas. 
La estava eu certa manha, faxina, plantão, sentinela sei la o que, mas depois de verificar que a limpeza era aceitável como sempre, retirei-me para junto ca cantina onde havia uma restea de sombra, bem decidido a nao vigiar nada nem ninguém, ( passaria de vez em quando), ate porque os Kmeres vermelhos  ainda nao tinha tomado o poder no Camboja.
Do meu "posto de observação"observava o movimento até que passou por la um membro de uma milícia local designada: G.E.s. Esperava eu que os odores se dissipassem  a fim de intervir, mas quem nao esperou foi o Com. de Bat. que decidiu naquele dia, utilizar as nossas instalações. Vinha eu ao seu encontro preparando-me para lhe fazer uma grande vénia,  quando ele me interpela: es tu que estas de sentinela aqui?! Espera que alguém vira falar contigo. Com efeito nao tardou que um enviado do Cap. me viesse informar que este me queria ver.
Os balneareos nao estavam limpos quando o nosso Com. la foi; levas quatro reforços de castigo.
Sequência do "Evangelho" segundo L.
Em Angola tive duas guerras: uma movida por um inimigo que pouco me incomodou, outra pelo Com. de Comp.

Antonio S. Leitão.

OPERAÇÃO BAMBU.

Depois de instalada em Nambuangongo, sentiu certa C.C.S. um dia , a necessidade de construir uma cantina, e seguindo o proverbio que diz: em Roma, faz como os Romanos, foi decidido que em Africa se faria como os Africanos.
Eram + ou - assim os nossos bambus.
Antevendo as normas urbanísticas actuais, e ou com a finalidade de alimentar o comercio local era de bom tom recorrer aos materiais encontrados localmente para se construírem as "habitações" e como a terra abundava, faziam-se com ela blocos que eram utilizados para erguer as paredes.
Foi todavia esta opção rejeitada, quiça os blocos exercessem demasiado peso sobre o flanco da colina onde a obra de arte seria instalada e era uma tragedia. Como as cabanas que serviam de caserna eram de madeira,  a cantina nao podia nem devia destoar muito. Na impossibilidade de termos cerveja realmente fresca, ( ja narrei que os frigoríficos funcionavam a petróleo), a cantina devia ser arejada. Que à noite a luz passasse pelas frinchas indicando ao IN a nossa posição, pouco importava. Que mil bambus apareçam!
Quando em Novembro de 1972 nos la chegamos, ja as paredes tinham perdido todo seu esplendor e era imperioso reconstrui-las. Bendita a floresta Angolana, ali tao pertinho! Partimos em busca dos bambus, e à excepção das formigas quissondo, ninguém nos incomodou.
Aqui nao rachavamos os bambus, mas lenha na cap. d'aguas
 e  Ambrizete. Se insiro esta foto aqui, é porque eu e o Maia,
que pegamos no serrote, fomos dois dos contemplados
com 9 reforços de castigo. O terceiro, era o nosso amigo
Dantas ja falecido. REQUIESCAT IN PACE.
De regresso a "casa", devíamos rachar as canas todas e por grupos de dois ou três, metemos mao à obra: Toma o bambu, racha o bambu, toma o bambu racha o bambu, mas à força de tanto bambu rachar, resolvemos fazer uma pausa. Foi o momento escolhido pelo Com. de Comp. para fazer uma ronda pelo nosso "estaleiro". Ola, estais cansados?! dai-me os vossos números; nove reforços de castigo, tà,?! Gloria a ti Capitão; nos meus tempos de sacristão dizia outra coisa, mas com estas andanças e com outras, perdi o meu latim.
Depois de rachados os bambus, a fim de que obra nao custasse nada, talvez devêssemos ter utilizado folhas de palmeira para os fixar nas paredes, mas o "generoso" Com. conseguiu arranjar uns punhados de pregos; oxalá o gesto nao o tenha impedido de conseguir mais um galão. Era por essa razão que alguns nos faziam a vida negra.

Antonio S. Leitão.

MEU CORONEL...

"Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espirito de fraternidade."


(Artigo 1° da Declaração Universal dos Direitos do Homem.)




Prezado Comandante,
Sinto muito se naquele dia o feri, quando fazia alusão aos aumentos que nao tivemos durante a guerra, e às metralhadoras que nao possuíamos na Capital dos Dembos. Saiba que nunca tive grande vocação  para as contas; gosto de palavras como "tartempion", por exemplo, mas sou um tanto ou quanto "alérgico" aos algarismos e quando eu dizia que precisávamos de duas metralhadoras pesadas, enganei-me, porque afinal necessitávamos de seis, ou seja: duas para nos defendermos na rua, e quatro para termos em "casa".
Nao sei se o Senhor sabe, mas eu digo-lhe: escassos meses antes de chegarmos a Nambuangongo, a guarnição ai presente foi alvo de violentos ataques diversas noites consecutivas. Convém referir desde ja, que Nambu, (como lhe chamávamos por "afecto"), nao era Biên-Diên-Fhu.
O "Waterloo" que exercito francês conheceu no Vietname foi comparado com um capacete de "boca" para cima, estando os franceses no fundo, e o viet-minh  nas colinas adjacentes, sendo estas consideradas inacessíveis aos vietnamitas pelos estrategos  franceses.  Se quiséssemos  utilizar o capacete para ilustrar a topografia de Nambu., entao haveria  dois: um mais pequeno para nos a CCS, outro maior que dava guarida à nossa Comp. Op., ao Pel. de Morteiros e ao P.A.D. , mas aqui os capacetes estariam de boca para baixo, connosco no cume e o IN. à volta, la em baixo no fundo.
MG-42.    (foto net)
Como o Sr. sabe melhor do que eu, (é por isso que é Com.) , quando em Junho de 1944 os Aliados desembarcaram na Normandia, ja foram "acolhidos" pela terrível MG-42; no ano da graça de 1972, ou seja 30 anos depois, estando nos num dos "teatros" de guerra mais "quentes" de Angola, nao possuíamos  
uma so. Acontecia aquando dos nossos "passeios" pedirmos aos nossos vizinhos que nos emprestassem uma  velha Breda, mas quando nao era possível, íamos apenas com a G-3. Nao diga a ninguém, mas por vezes aquilo metia medo e quando um dia dissemos ao Capitão que nao havia Breda ele retorquiu: esta CCS so quer metralhadoras, quando eu for, levo a minha caçadeira. Ele nao ia, claro.
Nambu. Aqui "morava" a CCS.
Mas... ... e você também la esteve?! E nao tinha dito nada?!  E também teve medo de morrer quando ia a Quipedro ou à Madureira?! Oh!... "coitadinho"! 
(*)
Imaginemos Caro Coronel, que os "intrusos" que tentaram entrar naquela terra "sagrada", eram saudados por uma dúzia de 'Maschingewhr' que como se sabe eram dotadas de uma cadencia de fogo de ... (quem disse 1200 tiros /minuto? Eles atacavam uma vez, mas nao duas ou três. Em primeiro lugar, tinham medo, em segundo lugar, muitos ficavam la sepultados aquando do primeiro ataque.
(*) In "la Suisse, l'or et les morts", par Jean Ziegler (Seuil)
Le Nouvel Observateur. si l'auteur se sent lésé, qu'il me
prévienne. Merci.
Custava caro custear tal diluvio de fogo? La se ia o ouro que  os nazis enviaram a Salazar em troca de volframio; algum dele roubado, refundido na Suíça e posteriormente enviado para Portugal?! Ouro em troca de metralhadoras?! Morrei filhos da p. , mas isso nao. Era ou nao essa a filosofia dos nossos Com. Supremos?
A carne para canhão, começava entretanto a escassear; a nossa comissão foi prolongada de quatro meses, mas se esse "prolongamento"se traduzia para nos em miséria, insultos e o adiar do futuro, já para S. Exas. se traduzia num bom pé-de-meia.
Que os vindouros saibam.


jeudi 22 décembre 2011

OPERAÇÃO PALMEIRA.

Debruçada sobre o Atlantico, entre Luanda e S. Antonio do Zaire, a pitoresca vila de Ambrizete podia no contexto da época, considerar-sa um pequeno "paraiso"nao fosse o facto de termos um graduado em cada esquina, e as "beatas" que nas horas vagas deviamos apanhar do chao, e para coroar o todo, a nossa fossa atingiu o ponto de saturaçao. Foi posta à prova a imaginaçao do nosso Com. de Bat. que decretou: Venham as pas e as picaretas, e os nossos homens construirao uma fossa nova.
Com efeito nao tardou que a nossa "obra de arte", pudesse ser exposta à admiração de todos. Ela ai estava; comprida, comprida, estupenda, deslumbrante a nossa fossa nova. Cagai todos e se necessário, "faremos" outra. E houve ainda outra finalmente. Subsistia todavia um problema: escasseavam os materiais de construção, a fim de tapar aquele buraco enorme.
Cimento? Querias cimento, pobrezinho?! Convém recordar que das fabulosas riquezas Angolanas pelas quais estávamos prontos a dar a vida, nao víamos um atomo, à exepçao do petróleo que alimentava os nossos frigoríficos, porque para nos ainda nao tinham sido descobertos os eléctricos. Nos éramos uma espécie de periferia, so nos faltava a mandioca, para sermos um Musseque. Veio entao em nosso socorro a " generosidade" no nosso Com. que desta feita pôs à nossa disposição a rica flora Angolana: Que vao para  a mata cortar palmeiras; dai-lhes ração de combate para três dias e que nao apareçam enquanto nao tiverem cortado cinquenta. Poder-se-ia dizer: palavras da ilha da Salvação, ou seja o degredo onde esteve  "Papillon".
"Armados" de serrotes e machados, "rumamos" para Norte em busca das almejadas arvores. Encontramo-las antes de Quinzau, e a "operaçao" prevista para tres dias foi executada num dia so; regressamos a "casa" convictos de que haveria um gesto da hierarquia.
Depois de colocadas as palmeiras sobre a fossa, era indispensável cobri-las com uma espessa camada de terra. Metemos mao à obra e contrariamente ao comboio que dizia: pouca terra, pouca terra, nos espalhamos muita terra, muita terra, mas nao a pusemos toda naquele dia, ate porque Roma e Pavia, nao se fizeram num so dia. 
Nao entendeu assim o nosso grande Com. que encarregou o Oficial dia de fazer o respectivo relatório, e o Com. de Comp. de pronunciar a "sentença": três reforços de castigo para cada um dos participantes na " operaçao" terra, ta bem?! Eram assim os "gestos" dos nossos Comandantes.

Antonio S. Leitão.

ENTRE AMBRIZETE E TOMBOCO.

Em matéria de guerra, devíamos começar por fazer nos  próprios, o que exigimos dos outros.


(Alexandre o Grande.)


Durante o serviço militar, se queríamos saber o que nos reservava o dia seguinte, passávamos pela frente da secretaria, e depois de um olhar de soslaio à escala, dávamos meia-volta, mas podia acontecer que a secretaria viesse até nos. Com efeito naquela tarde, aparece no limiar da nossa caserna um escriturário  trazendo na mao um papel que afixa na porta, enquanto lança lacónico: O Pelotão vai sair. 
Eramos um mini Pelotão de Reconhecimento e Informação, que com outros tantos Sapadores constituíam o único grupo, que por natureza devia estar apto a sair a qualquer hora, mas aqui "sair"tinha um significado algo diferente: vestir rapidamente o camuflado, apertar à cinta as cartucheiras que com a arma, permaneciam dependuradas ao fundo da cama, encher o cantil de água e correr na direcção do portão, lugar  de "rendez-vous "com os condutores que nos levariam ao destino, era isso "sair". 
Geralmente a nossa "jurisdição"estendia-se por uma faixa de terreno que partindo de Ambrizete para Norte, podia ir até Quinzau ou Santo Antonio do Zaire, e para Sul, parávamos antes de Ambriz, sem  nos afastarmos muito do Litoral, o que nos permitia "evoluir" sobre terreno mais ou menos plano. 
Naquele dia deparamos com um cenário algo diferente. Destino secreto, objectivo confidencial. Ao chegarmos ao cruzamento onde habitualmente virávamos  à esquerda, seguimos em frente e entramos em terra mais acidentada; depressa percebemos que a "muralha Atlântica"deixava de nos proteger. Envolvidos em espessas nuvens de po,  percorremos algumas dezenas de quilómetros, e fomos "aterrar" no aquartelamento de uma das nossas Companhias Operacionais, "estacionada" em Tomboco.
Apeados que fomos das viaturas, indicaram-nos o rez-do-chao de uma casota cujo solo estava coberto de  capim seco, ou seja palha, como um curral de porcos. Uma voz começou a reclamar se aquilo era para homens, ao que outra (a minha ) retorquiu que nos considerássemos felizes dormir ali, porque talvez outros estivessem em pior situação, e estavam mesmo.
Estávamos nestas conjecturas quando uma contra-ordem nos indica um lugar onde dois bojudos "pássaros" negros tinham pousado. Compreendemos entao que a situação nao era confortável. Dois helicópteros Puma, foram o suficiente para "tragar" o Pelotão. Descolamos direcção ao Sul, estava o dia a chegar ao fim, quando pousamos sobre o cume de uma montanha.
Estávamos  na época do cacimbo, mas alguém "esqueceu" de nos avisar que iríamos dormir apenas com a roupa que levávamos. Se nas zonas humidas o capim pode culminar a cerca de dois metros, aqui dificilmente atingia os 50 centímetros, e era raro. conseguimos todavia o suficiente para enrolados como porquinhos nos protegermos do relento.
No dia seguinte um helicóptero trouxe-nos ração de combate e agua, mas o precioso liquido vinha em "jerricanes" do gasoleo; pouco importava, era aquela ou nada. Passou-se uma noite, outra e mais outra; os dias sucediam-se iguais e "ainda" bem. Fomos entretanto "informados" que um numeroso grupo de guerrilheiros tinha penetrado na zona, dai a razão pela qual o nosso Batalhão estava "mobilizado" a fim de os impedir de ir mais longe.
Consta que na sequência de uma tentativa de aterragem de heli. um Pelotão nosso foi atacado e disperso alguns colegas teriam andado perdidos durante 3 dias. Do "ar condicionado" teria emanado ordem para que a zona fosse bombardeada o que o Com. de Bat. teria recusado. Aprendi a considerar credíveis as informações compostas de 3 noticias diferentes mas convergentes, pelo que poria aqui 1 (?).
Perorando perante a nossa Comp. de tomboco, teria o mesmo Com. afirmado que um Bat. enquanto nao tivesse meia-duzia de mortos, nao se poderia considerar um verdadeiro Bat. Teria dito  isso? 
Começávamos a "gostar" da "cama", quando ao fim da nona noite, veio a ordem de regresso, mas habituado que estava a dormir no chão, tive dificuldade em dormir de novo no meu leito. Faz-me lembrar 
certas consciências "aviltadas" que habituadas a certas situações, afirmam que o antigamente era melhor.

Antonio S. Leitão.

mercredi 21 décembre 2011

VER MORRER EM NAMBUANGONGO

Na noite escura, um estrondo. Inútil consultar o calendario a fim de saber qual a localidade que estava em festa, ou quem deitava foguetes. Nao; nao havia lugar nem tempo em Nambuangongo para festas ou romarias. Aguardamos as primeiras informações e estas nao tardaram: A escassas dezenas de quilómetros, uma Fazenda estava sob fogo inimigo.
Creio que nao era costume a infantaria ir ajudar os "vizinhos durante a noite; se a artilharia o pudesse fazer, tanto melhor. Continuamos na expectativa; foi entao  que irrompeu no nosso reduto um Land-Rover. Aos solavancos pela picada, um dos membros da guarnição que protegia a Roça, fez o trajecto até ao nosso quartel com um ferido na carroçaria, na esperança que o nosso médico o pudesse salvar.
Com alguns colegas fui até à enfermaria. Estendido numa cama, ainda com os olhos abertos, jazia um corpulento homem de cor. O ventre aberto expunha um monte de  vísceras. E indescritível o que se sente em tais circunstancias. O médico tacteava-lhe o que restava intacto da barriga, enquanto o Comandante do meu Pelotão, observava num tom que mais parecia uma suplica: estes tipos sao muito resistentes, ao que o médico respondia com um lacónico "nao".
Esgotavam-se as esperanças. Ja o enfermeiro de serviço lhe aplicava uma injecção, talvez a fim de que o nosso homem, sofresse o menos possível. Quando se  entrava na antecâmara da morte, o "prémio" era uma injecção de morfina. 
Nas palavras do meu Chefe de Pelotão, entrevi o deseje de que algo de "impossível" fosse tentado, mas era já tarde.
Tive vontade de pegar na arma, correr para a mata e gritar: saltai para aqui, filhos da p. que eu f. os c. nao havia nada a fazer; esperar secretamente que na noite seguinte, nao fosse a nossa vez e já era bastante.
Em Nambuangongo acontecia os "vizinhos"virem pedir caixões para os seus mortos; daquela vez, nao vieram.

Antonio S. Leitão.

dimanche 18 décembre 2011

EH PA, TU VAIS MUNICIAR A BREDA.

Eu tive um livro na vida, 
Livro que li tanta vez,
Um livro que me emprestaram
Um livro chamado G-três,
Mas as paginas desse livro
Eu nao voltarei a ler, 
Porque esse livro emprestado
Tem por dono outro ser
Porque livro "emprestado"
... ...
Larai lai lai. 




Durante a guerra, se havia "saídas" agendadas, outras havia, que eram surpresa total. Efectivamente naquela manha, contrariamente ao habitual deixamos Ambrizete pelo lado Sul, e "rumamos" direcção Caxito ou Luanda, sabendo de antemão que nao chegaríamos à Capital.
Tínhamos o "privilegio" de circular sobre asfalto, caso raro, e isso ja era positivo. o facto de nao irmos para  o Norte, também  nos tranquilizava. 
Metralhadora Breda. (foto net)
Pouco depois de entrarmos em zona arborizada, sem razão aparente, a coluna parou. Como sempre saltamos das  viaturas, e dispersam-nos pelas bermas da estrada, nao fosse o diabo tecê-las. Saltei mais devagar, porque naquele dia viajava em Berliet. Encontrei uma concavidade entre a estrada e a mata e "instalei-me" por ai, uma chumbada vindo quase sempre a meia-altura, o corpo junto ao solo, oferecia um alvo menos fácil. Lembrei-me porem de uma ordem que o Com. de Pel. me deu antes de partirmos: Eh pa, tu vais municiar a Breda.
Habitualmente havia um so homem a ocupar-se da metralhadora, mas talvez ao corrente de algo que nao revelou, ele quis ter a certeza que naquele dia, haveria dois, o que até era normal. Voltei para cima do camião e como o meu "papel" era em caso de problema, municiar a metralhadora, aproximei-me de uns caixotes cinzentos que se encontravam junto à cabina, e de cócoras ou de joelhos (?) comecei a extrair dai alguns carregadores de munições. foi entao que do outro lado soaram uma rajadas pontuadas por uma   
morteirada. Era o nosso baptismo de fogo. Levantando os olhos,gritei ao meu colega: olha essa merda, pa! Apontava ele a arma na direcção certa, e acto continuo, desencadeou a nossa resposta.
Nao foi fácil com a mao esquerda introduzir novo "pente" na fenda, já que era a primeira vez; depois meti outro e mais outro. Fez-se entao um grande silencio; um silencio ensurdecedor! Longos instantes! Houve um arranque seguido de uma travagem que teve por efeito danificar o manobrador da minha G-3, abandonada no chão metálico junto ao tripé da Breda. Nao podia ocupar-me de duas armas, mas isso é outra "historia".
Chegou finalmente a ordem de seguir e fomos até Musserra onde permanecia um Pelotão de outra Companhia. Se a memória nao me atraiçoa, o grupo que ai "descansava" foi revezado por outro, e este foi operar no local da emboscada. Dias depois, sussurram as gazetas que haveria recompensas. Imaginem  
que o Com. de Comp. mandou comprar um bilhete de ... ... cinema para o atirador da Breda, outro para um colega cuja perna se encontrava na trajectória de uns pequenos estilhaços da granada caída no meio da estrada. Mas se as munições vomitadas pela Breda fui eu que as la meti, porque nao me deram também um bilhete de cinema? Apeteceu-me chorar, bater o pé; o cinema ali tao pertinho; ouvia-se o Paco Bandeira cantar: o Elvas, o Elvas; ouvia-se o Caminheiro; e eu que dede entao nao mais o ouvi; mas emprestem-me o Caminheiro, "carago".
Sejamos serios: eu nao queria nada, "recompensa" nenhuma; eu so queria o Caminheiro.
A minha G-3 ficou danificada por muito tempo.
P.S. Finalmente encontrei o Caminheiro.

Antonio S. Leitão.

"CATORZE OVELHAS RANHOSAS"

A verdadeira coragem, e a das 3 horas da manha, em frio, em jejum
sem testemunhas!


(Napoleao)




No inicio dos anos 70, procedia a JAEA a reparaçoes diversas de uma estrada algures no Norte de Angola, e estando o meu Batalhao por ali,foi o nosso pelotao solicitado a fim de garantir a segurança do pessoal. Regressavamos ao fim do dia sempre a tempo para o jantar, mas quis o acaso que certo dia chegássemos depois de o rancho ter sido servido.No interior da caserna que nos foi afectada, havia por cima das camas uma tábua que dando a volta completa, servia de pista de atletismo às baratas, mas era ai que guardávamos o nosso prato de aluminio amolgado de tal forma que parecia ter levado pontapé de "meia-noite". Peguei o meu,meti-o debaixo do braço e ai vou eu a caminho do refeitório. Estando este quase vazio, instalei-me sozinho a uma mesa, hesitando ir à cozinha buscar o tacho ou esperar que um cozinheiro me servisse. Das mesas vizinhas chegava um murmúrio cujo teor acabei por adivinhar, porque segundo certas "bocas" admitia-se a hipótese ed um levantamento de rancho. Pensei que a hora de revolta tinha soado. Voltei para a caserna onde reinava certa algazarra, sendo uns pro, outros contra. Lancei para o ar uma frase copiada numa fotonovela: " Viva a revolução, e aqueles que fazem". Mal eu sabia a hora em que a pronunciava. Era o inicio da descida ao Inferno.
Fui para a cantina, e para esquecer que o estomago ficaria vazio até ao dia seguinte, bebi duas cervejas em vez de uma. Começaram entao certas "bocas" a dizer que o Oficial dia aconselhava  alguns a fim de que declarassem ter comido. Constava que um so o tinha feito, mas era o suficiente para que tudo malograsse.
No dia seguinte, voltamos para a estrada, e quando e quando ao meio-dia viemos almoçar, estava à nossa espera o Com. de Comp. tendo na mao um papel com alguns números; ficamos entao a saber que dos 104 homens que formavam a Companhia, ficamos 14. Soubemos também  que havia bufos no interior da mesma, porque quando o capitão chamou pelos nossos números disse a certa altura: Hà entre vos um russo careca que ameaçou deitar as terrinas a baixo das mesas. Claro que nao possuia o numero do colega em causa, mas depressa o identificou. Quem "bufou" nunca se soube. Estávamos metidos numa bela alhada. 
Nos dias que se seguiram fomos submetidos a interrogatorios diversos; ameaças em serie: Nos éramos as ovelhas ranhosas da companhia, nos iríamos para o forte ou entao para o Leste. E se a companhia for toda nao me importa; eu fico no meu escritorio e declarar que o morto levou umas calças, uma camisa e umas cuecas é-me indiferente.
Estávamos à espera que as sanções caíssem, mas tudo ficaria em "aguas de bacalhau". Nao fomos punidos, quem sabe, porque éramos 14? Se fossemos 100, talvez nem ovelhas ranhosas fossemos e se hoje fossemos mil?

P.S. Eu paguei com lingua de palmo.

Antonio S. Leitão.

samedi 19 novembre 2011

02 de Janeiro de 1972.

02 de Janeiro de 1972.
Era um Domingo como os outros. Mais frio e cinzento, normal para o Inverno. Depois de introduzir numa pequena mala, os  meus parcos haveres saio pela porta do lado  Norte, porque era  esta que  dava para a  estrada  nacional. Depois de atravessar o pátio que daquele lado era mais pequeno  encosto-me à ombreira do portão e ai  aguardo  a chegada de um autocarro da União de  Sátão  mais pequeno que os outros, porque só fazia a ligação  Sátão Aguiar da Beira. Chamavam-lhe a carreira das três . Instantes  mais tarde, uma apitadela na ultima curva , avisar-me-ia  que tinha soado a hora.
                                         A bordo do Vera Cruz  10/01/1972.
Atravesso  a estrada em obliqua , o que tem o condão de me levar à esquina da taberna frente à qual ele  parava.
Abro  e acto continuo fecho  a porta traseira. .Quando pus o pé no estribo ainda « consegui » dizer Adeus pessoal às pessoas que então vieram à porta. Quando o autocarro arrancou, vi que o meu irmão Fernando chorava.      



 Primeira etapa, Sátão, segunda etapa Viseu ; comboios diversos levar-me-iam até um ponto situado no meio de « nulle part » chamado Santa-Margarida.
Desta vez era a sério, não havia margem para duvidas : brevemente receberíamos os camuflados e embarcaríamos rumo a  Angola.
Nove dias depois, pudemos dizer: terra, terra!
Chegou o dia « D » e na hora « H » fomos introduzidos nas  entranhas do majestoso transatlântico  que dava pelo nome de  Vera Cruz.
Depois de uma travessia de nove dias, pudemos de novo dizer : terra, terra, mas tínhamos mudado de continente : Estávamos na  ‘África  dos elefantes e das  girafas. Apos o desembarque, esperava-nos um comboio que geralmente  tem bancos, mas as fabulosas riquezas Angolanas  pelas quais nos estávamos prontos a dar a vida, não chegavam para por bancos no « nosso » comboio, e como gado, « embarcamos » em  vagões que nos levariam  até  um loteamento de barracões de cimento  situado no meio de um grande areal. Não vão  pensar que  era a praia, tal como o comboio, também as “casernas” davam a impressão terem sido concebidas para acolher animais.
A entrada de cada barracão, havia de cada lado uma placa de 
cimento  e em cima destas uma fila de colchões  ascorosos repletos de um pó amarelado  que talvez dez anos antes  tivesse sido palha.
Ficávamos por lá alguns dias; vinham seguidamente grandes camiões equipados de altas cancelas,(cuidado não fosse a mercadoria suicidar-se), e então como dizia o poeta, lá íamos nos, de Luanda para o Norte.











PATRIA,


"Pudeis bater-nos, mas nao abater-nos ou desonrar-nos!
(Leon Gambetta) 
Recordo aqueles Invernos distantes durante os quais eu passava as horas livres à fisgada aos pardais, talvez por essa razão, logo que atingi a maioridade, deste-me uma linda espingarda. Constatando porem, que tinha pouca pontaria, enviaste-me para Angola, e é verdade que lá os “pardais” eram enormes, mas não havia nada a fazer; eu não lhes acertava; quando eles voavam nas alturas, eu enviava-lhes umas chumbadas, mas eles fintavam-me e eu pobrezito, regressava a “casa” sem um mísero pássaro à cinta. Decididamente, não tinha vocação para caçador; devias ter-me confiscado a arma; e aqueles “cartuchos” que desperdicei, que pena!
Como eu era adepto do Sporting, deste-me lindas roupas verdes; não era o nosso verde preferido, mas a intenção era louvável, pena foi que os adeptos das outras equipas não fossem contemplados; eu pedir-lhes-ei desculpa quando os encontrar.
Lembras-te que raramente te davam fruta?
Compra agora um quilo de maças.
Nos iamos floresta dentro.
A fim de que tirássemos o máximo proveito da nossa estadia naquela terra Africana, organizavas grandes excursões, e aos solavancos, lá íamos ao longe mas como o sol tropical nos “amolatava” a epiderme, autênticos túneis foram abertos na densidade da selva, e montados nos “nossos” MERCEDES-BENZ, íamos floresta dentro “saborear” toda a beleza e frescura da exuberante flora Angolana, sem esquecer o espectáculo proporcionado pelos macaquinhos saltando de uma para outra arvore. Convenhamos que os nossos Mercedes não tinham as mesmas características dos outros: na ausência de ar condicionado, foram-lhes retirados o telhado, as portas e as janelas; como o condutor podia parar sem avisar, também as sebes da carroçaria foram eliminadas a fim de podermos descer à vontade. Corríamos o risco de dar umas cambalhotas, mas como andávamos à boleia, não podíamos exigir muito.
Lembras-te que raramente te davam vinho?
Compra também um quartilho, mas nao
gastes o dinheiro todo.
Podia acontecer que os “passeios” se realizassem a pé, mas quando o cansaço se fazia sentir, podíamos poisar pé, ante pé, calmamente, não fossemos nos esmagar os caracóis, ou assustar os passarinhos. Para que o “passeio” se prolongasse no tempo, havia também parques de campismo, tudo isto grátis, evidentemente: cama, mesa e roupa suja. Acontecia cortarmos uns punhados de erva e enrolados como porquinhos, dormíamos por baixo, e deste modo a paisagem não era desfigurada.
Recompensa suprema, reservas-me para quando, ou se eu chegar a idade da reforma, um premio que pode atingir a soma de ... Cento e não sei quantos euros.
Podia acontecer que os passeios se
fizessem a pé.
Eu compreendo a intenção, “pátria”: Vai e compra um quilo de maças. Lembras-te de que na guerra raramente te davam fruta?! Aproveita agora que são baratas; compra das mais pequeninas, a fim de darem para a semana toda. Lembras-te que também não te davam vinho?! Compra também um quartilho, mas não gastes o dinheiro todo. E queres que te peguemos na mão?
Tira a mão da farda. Gosto muito de ti, Pátria, mas confiscaste-me os meus melhores três   anos: ( Os copos que não bebei, os almoços que não comi, o dinheiro que não ganhei, as raparigas que não encontrei, ) diz-me agora o que posso confiscar-te.
Antonio S. Leitão.