Amanhã, 27 de Janeiro, dia de homenagem às vítimas do Holocausto, devíamos
recordar o nosso herói do Holocausto: Aristides de Sousa Mendes, um homem que continua a não ter o reconhecimento que merece. Aristides devia ser um dos heróis da
nossa mitologia colectiva, mas não é. Experimentem fazer perguntas sobre
Aristides aos miúdos do liceu. A maioria não reconhecerá o nome e, estou certo,
uma minoria de arruaceiros confundirá Aristides com um jogador do Borussia de
Dortmund ou coisa assim. Neste sentido, vale a pena consultar esta hagiografia
(não é uma biografia) de Miriam Assor. Com provas irrefutáveis, o livro revela
a grandeza de Aristides de Sousa Mendes.
Logo em 1939, Salazar emitiu a Circular 14, o documento que impedia os
embaixadores portugueses de dar vistos aos judeus ("quer tenham sido
expulsos do seu país de origem quer do país de onde são cidadãos").
Colocando em causa a sua carreira e a sua família, Aristides, o cônsul
português em Bordéus, desafiou Salazar e deu vistos diplomáticos a milhares
de judeus. Luxemburgueses, dinamarqueses, noruegueses, belgas e holandeses
invadiram Bordéus à procura do Santo Aristides. Desta forma, Aristides tirou 30
mil vidas da linha de montagem assassina. Enquanto a maioria se refugiou no
cumprimento da lei (Circular 14), Aristides assumiu que a lei pode ser imoral, assumiu que legalidade pode não ter legitimidade . A sua
heroicidade vem daqui.
Tendo em conta a estatura homérica destes actos, não se compreende o
relativo desprezo da cultura portuguesa por Aristides. Não há uma grande
biografia. Não há um romance. Não há uma série de TV. Não há um filme. Temos
um Schindler e não lhe damos valor. É como se a expressão "herói
português" fosse, em si mesma, uma contradição em termos. É como se a
expressão "herói português" fosse um incómodo para a nossa visão
cínica de Portugal.
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